15/02/04

Heroes (1977) e Quinta de Vale Meão (2000)

Dedico Heroes de David Bowie a mim próprio por ter ganho a Milésima Centésima Expedição Punitiva à Lampreia que teve lugar ontem na Catedral do Bernardes. Este hino é também dedicado ao meu amigo Paulo, que foi quem me ofereceu o fabuloso Quinta do Vale Meão/2000 com que me sagrei vencedor. Bem hajas, Paulo!
We can be heroes
Just for one day
Se há coisas raras de conseguir nesta vida efémera, uma delas é, certamente, um Maligno, o Óscar Negro da Esseponto, pintado e decorado pelas mãos exímias e pela cabeça perversa do nosso pintor, O Artista Anteriormente Conhecido Pelo Nome de Pilas. Ontem foi uma dessas noites raras em que tive os tais 5 minutos de fama e glória de que falava Andy Warhol. Ontem ganhei o meu terceiro Maligno, depois de volumosos anos a meter vinhos de excelência em Provas Cegas ainda mais excelentes.
I, i will be King and you, you will be queen
Though nothing will drive them away
we can beat them just for one day
We can be heroes just for one day.
Heroes começa com a guitarra espacial de Robert Fripp. Brian Eno – outro monstro visionário, acentua o efeito nas teclas e sintetizadores e já estamos em Andrómeda antes do refrão. Heroes é uma viagem interestelar, produzida em plena época do ácido. Quinta do Vale Meão/2000 é um vinho de excepção, um Ambrósio, na terminologia criptográfica da Esseponto. Não é para me armar aos cágados mas todos testemunharão que eu tinha a vitória de ontem como certa. Foi só pensar: já tínhamos provado o Vale de Meão/99 noutra ocasião e considerámos que necessitava de tempo para apurar as potencialidades. Assim, pensei que esta colheita de 2000 estaria agora, quatro anos depois, em condições óptimas, ainda por cima, sendo a lampreia um prato muito forte, a exigir tanino. Foi em cheio! Obviamente os vinhos apaneleirados do João Portugal Ramos e as castas Syrah lixaram-se. E bem – dois vinagres! A lampreia não quer sabores florais, quer alguma adstringência, quer tanino redondo, que não excessivo. Passámos toda a noite à procura dessas qualidades nos vinhos presentes. É certo que as encontrámos noutros vinhos e faço aqui jus aos 4 convidados que estiveram à altura do acontecimento.
I, i wish you could win
Like the dolphins, like the dolphins can swim.
Though nothing, though nothing will keep us together
We can beat them for ever and ever
Oh we can be heroes just for one day
A voz de Bowie começa a impor-se pela calma, pela tranquilidade. Há um momento na música de perfeita fusão entre o som espacial dos sintetizadores e a placidez de Bowie. Mas depressa se quebra esse oceano da tranquilidade e a música torna-se instável, nervosa, cada vez mais rock, cada vez mais dura… Gradualmente, a guitarra de Carlos Alomar faz-se notar como metal no meio do som planante da dupla Eno / Fripp. A voz de Bowie torna-se cada vez mais agressiva, agora é um grito de raiva, um grito de fé, sim, é verdade we could be heroes…

Com um Quinta da Leda, um Callabriga, um Reserva do Esporão e um Trincadeira (da herdade do Esporão?), os quatro convidados foram quatro magníficos. Estiveram à altura! Mas estiveram abaixo, mesmo assim, do excelente Gouvyas do nosso regressado Lampião e ainda mais do Vale Meão.
And the shame was on the other side
Oh we can beat them for ever and ever
We could be heroes just for one day
We can be heroes
We can be heroes
Até por isso mereço a música do Bowie – fomos ameaçados pelas excelentes escolhas dos convidados, mas mais uma vez o Maligno não saiu do Universo Confradal. Não sei se repararam que nunca, em 200 anos de Provas Cegas, um convidado logrou ganhar um Maligno. É obra! Ainda está para nascer o convidado que no arrebate um Maligno – e já muitos, um exército deles, o tentaram. Hoje, lá jazem todos, no pó da arena dos vencidos! Para mim (e para o Paulo) cá vai pois em altos berros:

We can beat them for ever and ever
We could be heroes
We could be heroes…

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